O CARTEIRO
A chegada do carteiro era um acontecimento diário.
Toda a gente sabia que àquela hora, mais ou menos depois do
almoço, ele subiria a Rochinha, trazendo na sua grande bolsa de couro castanho-claro,
as notícias de familiares e amigos que se encontravam no outro lado do mundo.
Assim que se ouvia o toque da corneta a anunciar a sua
chegada, ninguém perdia tempo: mulheres, raparigas e também os pequenos convergiam
apressadamente para o largo da ponte, umas porque estavam mesmo à espera de
carta, outras porque queriam comprar os selos para enviar outra carta, algumas
também por simples curiosidade e muitas vezes com um certo desejo de
bisbilhotice à mistura.
À roda do carteiro todos olhavam ansiosamente, com olhos de saudade
e esperança, o grande maço de cartas ordenadamente arrumadas que ele trazia na
mão. Todos sabiam que os envelopes de moldura azul e vermelha eram as cartas da
Venezuela, e os de verde e amarelo, as cartas do Brasil. Os nomes iam saltando,
um após outro, pela voz do carteiro, para alegria de uns e tristeza de outros,
mas ninguém perdia a esperança de que uma cartinha no seu nome, num qualquer
dia haveria de chegar.
As cartas da Venezuela eram sempre em maior quantidade do que
as cartas do Brasil. Os mais velhos diziam que o Brasil era a “Terra dos
esquecidos” porque só lá de vez em quando é que alguém se lembrava de escrever.
Mas a contrariar este ditado dos mais velhos, e embora de vez em quando também
chegassem algumas das primas da Venezuela, a maior parte das cartas que a mãe
recebia em seu nome, vinha dos seus irmãos do Brasil que escreviam com alguma
frequência.
Quando no meio das cartas da Venezuela aparecia o verde e
amarelo do Brasil, o mais certo é que fosse uma carta para a Teresinha das
Fontes. E quando isso acontecia, a mãe ficava sempre feliz e todos nós
sentíamos como nossa aquela felicidade.
Era sempre uma enorme alegria e satisfação sentir que apesar
do grande mar que nos separava, os tios lá estavam pensando em nós, como nós
também nos lembrávamos deles, e continuávamos unidos pela mesma saudade.
Funchal, 14- 05-2017