domingo, 14 de maio de 2017

Carta do Brasil...

O CARTEIRO

A chegada do carteiro era um acontecimento diário.

Toda a gente sabia que àquela hora, mais ou menos depois do almoço, ele subiria a Rochinha, trazendo na sua grande bolsa de couro castanho-claro, as notícias de familiares e amigos que se encontravam no outro lado do mundo.

Assim que se ouvia o toque da corneta a anunciar a sua chegada, ninguém perdia tempo: mulheres, raparigas e também os pequenos convergiam apressadamente para o largo da ponte, umas porque estavam mesmo à espera de carta, outras porque queriam comprar os selos para enviar outra carta, algumas também por simples curiosidade e muitas vezes com um certo desejo de bisbilhotice à mistura.

À roda do carteiro todos olhavam ansiosamente, com olhos de saudade e esperança, o grande maço de cartas ordenadamente arrumadas que ele trazia na mão. Todos sabiam que os envelopes de moldura azul e vermelha eram as cartas da Venezuela, e os de verde e amarelo, as cartas do Brasil. Os nomes iam saltando, um após outro, pela voz do carteiro, para alegria de uns e tristeza de outros, mas ninguém perdia a esperança de que uma cartinha no seu nome, num qualquer dia haveria de chegar.  

As cartas da Venezuela eram sempre em maior quantidade do que as cartas do Brasil. Os mais velhos diziam que o Brasil era a “Terra dos esquecidos” porque só lá de vez em quando é que alguém se lembrava de escrever. Mas a contrariar este ditado dos mais velhos, e embora de vez em quando também chegassem algumas das primas da Venezuela, a maior parte das cartas que a mãe recebia em seu nome, vinha dos seus irmãos do Brasil que escreviam com alguma frequência.

Quando no meio das cartas da Venezuela aparecia o verde e amarelo do Brasil, o mais certo é que fosse uma carta para a Teresinha das Fontes. E quando isso acontecia, a mãe ficava sempre feliz e todos nós sentíamos como nossa aquela felicidade.   

Era sempre uma enorme alegria e satisfação sentir que apesar do grande mar que nos separava, os tios lá estavam pensando em nós, como nós também nos lembrávamos deles, e continuávamos unidos pela mesma saudade.

 

Funchal, 14- 05-2017