quarta-feira, 16 de agosto de 2023

Dia de aniversário

 

RETRATO A PRETO E BRANCO

Reza a história que a menina nasceu numa tarde de muito sol. A parteira que a ajudou a nascer foi a Silvina, mulher do Viveiros e vizinha quase do pé da porta.

O pai estava ausente no Curaçao mas já tinha destinado que ia nascer uma Serafina, então quem lhe fez as honras da casa foi a avó paterna. E foi uma avó Serafina orgulhosa (toda arregaçada nas palavras da mãe!!...) que pegou ao colo a menina acabada de nascer e a trouxe à rua para mostrá-la à vizinhança.

Ouvi esta história vezes sem conta e de cada vez que a ouvia imaginava como se estivesse a ver um retrato, a avó comigo ao colo e as vizinhas à sua volta desejosas por me verem pela primeira vez. E tinha a certeza que lá estavam a prima e as raparigas Maria, Teresinha e Noémi, a Teresinha do Mestre José, a Teresinha Pita e provavelmente mais alguém.


Esta menina que já trazia ao nascer o nome de Serafina, nome escolhido pelo pai, recebeu também o mesmo nome do pai (Ângelo) e da sua madrinha de baptismo e assim ficou com o nome próprio de Ângela Serafina.

terça-feira, 15 de agosto de 2023

A alegria de ir para a Venezuela

 

NO DIA DO MONTE

No Dia do Monte, do ano de mil novecentos e sessenta e sete, véspera do meu sexto aniversário, a prima embarcou para a Venezuela. Teresinha trouxe-me com ela à cidade para despedir a prima e Noemi no cais e viemos todos no carro de praça do Mário, marido de Teresinha.

Da despedida não me lembro absolutamente nada, mas lembro-me bem de que fomos à Festa do Monte. Deverá ter sido esta a minha primeira vinda à cidade, um momento tão importante na minha vida que nunca mais o esqueci; e como já estava prevista a ida ao arraial, o pai deu-me uma moeda de cinco escudos para eu comprar alguma coisa, mas não os gastei e quando regressámos a casa já à noite, ainda os tinha na algibeira.

Quando a prima andava nos preparativos para embarcar eu andava sempre à roda dela, a apreciar tudo e mais alguma coisa, entusiasmada como se também eu fosse com ela para a Venezuela, mas com certeza ainda não teria bem a noção de que só voltaria a vê-la já depois de adulta e professora formada.

Nestas andanças a prima ia várias vezes à cidade, tratar das coisas importantes para o embarque, ia no horário da manhã e regressava no horário da tarde.  Eu passava o dia esperando que chegasse a tarde para ir esperar a prima à Achada de Beirão pensando sempre que ela haveria de me trazer qualquer coisa da cidade.

Num desses dias em que fui esperá-la, vínhamos a descer pelo Caminho do Cantaria, ali perto das figueiras do Ferreirinha, quando Ângela deixou sair um estridente fofózinho e a prima logo a repreendeu, dizendo que aquilo não se fazia e era falta de respeito. Mas Ângela, que desde que aprendeu a falar sempre teve a resposta à ponta da língua, encontrou logo a resposta para a situação e respondeu:

_ Oh, prima! Isto é com a alegria de ir para a Venezuela!

E a prima que sempre se ria com as minhas tontices, achou ainda mais graça a esta e teve que contar a todos, à mãe, ao pai, à avó Serafina e à madrinha a minha resposta com a alegria de ir para a Venezuela.

E a engraçada resposta ficou para sempre, como mais uma história da Serafina.

 

Funchal, 15 de Agosto de 2023