Do Chão dos
Louros à Encumeada
De vez
em quando gosto de ir ao bar da Encumeada tomar um café ou uma cerveja fresca,
principalmente no Verão. Gosto de me sentir abraçada pelo verde enquanto vou subindo
por aqueles lugares cujos nomes conheço tão bem como a palma da minha mão.
Também
gosto de ir até ao Calhau ou à Fajã da Areia onde posso olhar o azul e a
imensidão do mar enquanto vou ouvindo o marulhar das ondas e me deixo inebriar
com o inigualável cheiro a maresia, mas subir até à Encumeada desperta-me
sempre uma sensação diferente.
O mar esteve
desde sempre mais longe de mim, sempre o olhei com receio e muito respeito. As
árvores estavam ali mesmo, tão perto de casa e dos lugares por onde eu habitualmente
me movimentava, como os pinheiros do Lombo das Faias ou da Achada do Beirão, aonde
eu ia com os meus irmãos e outros pequenos buscar saruga, pinhas e gravetos
secos para acender o lume.
O
Lombo do Atalho, os Cabeceiros e as Lajas, as nossas Fajãs ou os Brimbeteiros
são nomes que entraram no meu vocabulário desde que aprendi a falar, lugares
que me habituei a ver como fazendo parte de nós e da nossa vida.
Nos
dias de hoje, quando começo a subir as Covas e passo pelas Caldeirinhas, as
curvas da estrada abrem-se para me deixar passar e saúdam-me sorridentes e
felizes porque não me esqueci delas. Nas bermas, os imponentes castanheiros que
mesmo de olhos fechados eu sei onde estão, e os loureiros viçosos de ramos
abertos sobre a estrada, parecem querer abraçar-me e convidam-me a desfrutar do
cheiro a floresta que tão bem conheço. Até um velho pereiro, completamente
cheio de barbas e com os ramos retorcidos a pender sobre uma brenha de silvado,
me faz um aceno de cabeça como que a dizer “Ainda estou aqui e sei que te
lembras de mim!…”.
E há
um pinheiro que já não existe, deverá ter morrido com a doença que há alguns
anos assolou os pinheiros, mas continua no mesmo lugar onde existiu, a abraçar
as minhas lembranças. Um pinheiro altíssimo com o tronco muito grosso, onde havia
sido pintada uma larga faixa branca a fazer a vez de marco, sinalizando a beira
da estrada. Quando nos dias pequenos eu ia do Funchal para São Vicente e a
camioneta chegava já de noite, era aquele pinheiro que me alegrava o coração,
indicando-me que já estava a chegar a casa.
No fio
da memória ecoa a minha voz de criança a cantar “Viva o Chão dos Louros, viva a
Encumeada…” e vejo-me de mão dada com Agostinho, ainda mais criança do que eu, a
cantar debaixo da vinha da nossa casa.
Agora estamos os dois a chegar à Encumeada, e lá nos sentamos a tomar uma cervejinha acompanhada com o desfiar
de algumas das nossas muitas lembranças que uma após outra nos fazem sorrir de saudade.
Funchal,
21 de Julho de 2024