segunda-feira, 22 de julho de 2024

Viva o Chão dos Louros!...

 

Do Chão dos Louros à Encumeada

De vez em quando gosto de ir ao bar da Encumeada tomar um café ou uma cerveja fresca, principalmente no Verão. Gosto de me sentir abraçada pelo verde enquanto vou subindo por aqueles lugares cujos nomes conheço tão bem como a palma da minha mão.

Também gosto de ir até ao Calhau ou à Fajã da Areia onde posso olhar o azul e a imensidão do mar enquanto vou ouvindo o marulhar das ondas e me deixo inebriar com o inigualável cheiro a maresia, mas subir até à Encumeada desperta-me sempre uma sensação diferente.

O mar esteve desde sempre mais longe de mim, sempre o olhei com receio e muito respeito. As árvores estavam ali mesmo, tão perto de casa e dos lugares por onde eu habitualmente me movimentava, como os pinheiros do Lombo das Faias ou da Achada do Beirão, aonde eu ia com os meus irmãos e outros pequenos buscar saruga, pinhas e gravetos secos para acender o lume.

O Lombo do Atalho, os Cabeceiros e as Lajas, as nossas Fajãs ou os Brimbeteiros são nomes que entraram no meu vocabulário desde que aprendi a falar, lugares que me habituei a ver como fazendo parte de nós e da nossa vida.

Nos dias de hoje, quando começo a subir as Covas e passo pelas Caldeirinhas, as curvas da estrada abrem-se para me deixar passar e saúdam-me sorridentes e felizes porque não me esqueci delas. Nas bermas, os imponentes castanheiros que mesmo de olhos fechados eu sei onde estão, e os loureiros viçosos de ramos abertos sobre a estrada, parecem querer abraçar-me e convidam-me a desfrutar do cheiro a floresta que tão bem conheço. Até um velho pereiro, completamente cheio de barbas e com os ramos retorcidos a pender sobre uma brenha de silvado, me faz um aceno de cabeça como que a dizer “Ainda estou aqui e sei que te lembras de mim!…”.

E há um pinheiro que já não existe, deverá ter morrido com a doença que há alguns anos assolou os pinheiros, mas continua no mesmo lugar onde existiu, a abraçar as minhas lembranças. Um pinheiro altíssimo com o tronco muito grosso, onde havia sido pintada uma larga faixa branca a fazer a vez de marco, sinalizando a beira da estrada. Quando nos dias pequenos eu ia do Funchal para São Vicente e a camioneta chegava já de noite, era aquele pinheiro que me alegrava o coração, indicando-me que já estava a chegar a casa.     

A estrada continua a abrir-se para me deixar passar e não me deixa esquecer que a Cova do Lanço é ali mesmo no lado esquerdo; num abrir e fechar de olhos sou abraçada por aquela curva familiar que imediatamente se transforma na comprida Ponte Ladeira que antecede o magnífico Chão dos Louros: o Chão dos Louros das cantigas da minha infância, dos passeios do colégio e dos romeiros na segunda-feira do setembro.

No fio da memória ecoa a minha voz de criança a cantar “Viva o Chão dos Louros, viva a Encumeada…” e vejo-me de mão dada com Agostinho, ainda mais criança do que eu, a cantar debaixo da vinha da nossa casa.

Agora estamos os dois a chegar à Encumeada, e lá nos sentamos a tomar uma cervejinha acompanhada com o desfiar de algumas das nossas muitas lembranças que uma após outra nos fazem sorrir de saudade.

 

Funchal, 21 de Julho de 2024