sábado, 17 de fevereiro de 2018

Uma história de nomes


NOMES DE SANTOS

No tempo dos meus avós, quando nasciam os filhos, havia em muitas famílias o hábito de lhes dar o nome do santo do dia em que tinham nascido, ou de outro santo do qual os pais fossem devotos. Assim também sucedeu na família do nosso avô materno, Manuel Machete, o avô das Fontes.

            A mãe gostava muito de contar a história dos nomes dos seus irmãos, os nossos tios, e eu sempre me encantei com estas histórias.

O mais velho do casal era o tio António Cipriano, assim chamado por ter nascido no dia de São Cipriano; o tio João Ildefonso tinha o seu segundo nome em honra de Santo Ildefonso; o tio Agostinho Silvano também devia o seu nome a São Silvano; a tia Maria Segunda tinha o mesmo nome de uma tia, irmã da avó Silvéria e a nossa mãe, Teresa de Jesus, por ter nascido em Outubro, teve o seu nome associado a Santa Teresinha do Menino Jesus.

Quando nasceu o tio mais novo da casa, sucedeu uma história engraçada a propósito do seu nome. O tio Manuel, filho mais velho pelo lado paterno, mas criado desde pequenino pela avó Silvéria com todo o seu carinho de mãe, foi perguntar à avó qual o nome que iam dar ao menino. Como a resposta fosse que ainda tal não estava destinado, resolveu dar a sua opinião. Então lá foi dizendo que todos os outros irmãos já tinham nomes dos tios da família da avó dos Barros e que o tio Francisco do Canto da Ponte, irmão do avô, estava “reinando”, ou seja, aborrecido porque ainda não tinha nenhum com o nome dele.

E para satisfazer o desejo do tio Manuel, o nosso tio mais novo recebeu o nome do tio paterno e chamou-se Francisco André, de todos o nome mais bonito, embora os outros também fossem bonitos, como sempre com muito orgulho (e com razão!...) a mãe o referia. E foi realmente uma família de Machetes com nomes bonitos, compostos com o sobrenome “de Oliveira Rodrigues”, da qual também sinto muito orgulho.

Embora, com muita pena, não tenha chegado a conhecer pessoalmente todos os tios, é como se os tivesse conhecido, porque sempre estiveram presentes nas histórias que a mãe nos contava, mesmo que na realidade vivessem no outro lado do oceano, nessa terra imensa e encantada que é o Brasil da nossa saudade. Os seus nomes hão-de ser para sempre lembrados, não só porque fossem bonitos, mas porque são ramos da nossa história.


Funchal, 17-02-2018

terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

As cantigas da rádio


O RÁDIO DE PILHAS

O rádio transístor de capa preta toda aos furinhos era de Pedro. Foi-lhe oferecido pela tia numa das suas frequentes demonstrações do carinho e estima que nutria pelo sobrinho mais velho. Tinha o seu lugar fixo em cima da mesa da cozinha, no lugar da cabeceira que ficava perto da janela e onde só Pedro e mais ninguém se sentava às refeições. O lugar da outra cabeceira era inquestionavelmente o lugar do pai.

O rádio de Pedro funcionava a pilhas, mas como não apanhava bem a frequência foi preciso arranjar-lhe uma antena, presa numa vara alta fora da janela, o fio enrolado no próprio aparelho e ligado na tomada da cozinha, tudo engenhocas dele que até deram bom resultado.

Este rádio fez parte da nossa vida de pequenos durante alguns anos e era através dele que ouvíamos as cantigas que estavam em voga nesse tempo.

Quando Pedro chegava a casa vindo do trabalho, a primeira coisa que fazia era ligar o rádio.

Durante a tarde, quando estávamos por casa, era logo sintonizado o Posto Emissor do Funchal (Aqui Funchal, Posto Emissor de Radiodifusão, CSB 91, Onda Média!...) para ouvirmos a Música Pedida. Havia cantigas que eram pedidas diariamente e nós já ficávamos à espera que elas surgissem para também as cantarmos em simultâneo, pois de tanto as escutarmos até já as sabíamos de cor. O mesmo acontecia com as publicidades que nós também achávamos graça e repetíamo-las muitas vezes nas nossas brincadeiras. Lembro-me sempre daquela publicidade do Império das Louças, na época de Natal e também aquela da agência de viagens que informava os passageiros da data de saída do barco com destino a Miami, mas antes parava em La Guaira, na Venezuela.

À noite já não havia música pedida mas havia um programa humorístico muito engraçado que nos fazia soltar gargalhadas com as peripécias de um tal “João do Cabeço”, cujas piadas seriam muitas vezes replicadas pela mãe por qualquer coisa que viesse a propósito.  

Mesmo depois de já estarmos deitados e de luzes apagadas, Pedro continuava com o rádio ligado, um pouco mais baixo para o pai e a mãe não ouvirem no quarto deles, mas eu ouvia muito bem porque o nosso quarto era mesmo ao lado. A essa hora ele ouvia as notícias na Emissora Nacional e o inesquecível “Quando o telefone toca” que também eu gostava muito de ouvir.

Este gosto de ouvir rádio não se perdeu com o tempo nem mesmo com as modernas tecnologias. No meu balcão da cozinha há um lugarzinho reservado para o meu rádio. Desde que esteja na cozinha tenho-o sempre ligado e não prescindo da sua companhia ao pequeno-almoço. E é sempre uma boa companhia!...