VAMOS AOS BARROS
O sítio dos Barros sempre fez parte das nossas vivências.
Aquele lado, como sempre ouvíamos, entrava muitas vezes nas
histórias que a mãe nos contava e, pelo modo carinhoso como de lá falava,
sentíamos que ocupava um lugar especial no seu coração.
Nos Barros nasceu e cresceu a nossa avó materna, a avó
Silvéria, e lá vivia toda a família desse lado materno. Para além dos irmãos da
avó, o tio António, a tia Segunda, a tia Joana que estava embarcada na América
e a tia Maria Luísa, também havia muitos primos e primas que a mãe e a tia
conheciam muito bem e a quem devotavam grande estima.
Muitas vezes ouvimos a mãe contar, de quando ainda era
pequena, as suas idas aos Barros, a casa da sua avó Antónia, sobretudo na
primeira oitava do Natal; a mãe lembrava com saudade que a avó oferecia um
brindeiro a cada neto e depois trazia uma joeira cheia de laranjas e distribuía
também por todos. Também sabíamos, porque ouvimos vezes sem conta a mãe e a tia
contarem, que o nosso tio Agostinho fora criado nos Barros em casa da avó.
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Tia Maria Segunda, avó Silvéria, tia Maria Luísa e tia Joana |
De vez em quando a mãe ia àquele lado visitar as tias e o tio, e
quando a tia vinha de São Jorge também costumava lá ir fazer a sua visita. A mãe
sempre arranjava um motivo para ir aos Barros, às vezes porque tinha os novelos de retalhos já prontos
para tecer tapetes e lá tinha uma prima que era tecedeira, ou então porque
queria ver a tia Joana que tinha vindo da América.
Ainda me lembro bem de acompanhar a mãe ou a tia quando iam
àquele lado. Nesse tempo não havia estrada por isso tínhamos que ir a pé; íamos
pelo Lombo de Baixo, descíamos o caminho da Terça por entre os eucaliptos que
logo no início nos tapavam a vista e os campos cultivados que se iam sucedendo,
e atravessávamos a ribeira lá em baixo no Foro; ali havia umas tábuas de
madeira a fazer de ponte, mas nem sempre lá estavam porque quando a ribeira
enchia levava tudo por lá abaixo, então tínhamos que passar para o outro lado
saltando de pedra em pedra.
Assim que chegávamos ao início do caminho dos Barros começava
a “peregrinação”. Ali mesmo morava uma prima da avó, e a mãe costumava entrar
para cumprimentá-la. Logo depois, já era a casa do tio António e quase
encostado, morava o seu primo Afonso; andando mais um bocado a mãe encontrava
ainda outras primas, para então chegar a casa da tia Maria Luísa. Também fazia
parte do roteiro a visita ao primo António e a uma tia já velhinha que morava
lá perto; e não podia faltar a visita à tia Segunda que vivia nos Lameiros e ao
menos um cumprimento e umas simples palavras às sempre estimadas primas.
Assim se passavam as horas. O tempo não chegava para todas as
visitas e o regresso tinha que ser ainda com dia porque era perigoso atravessar
a ribeira de noite e subir a Terça às escuras, pois não havia luz.
Já depois de um pouco mais crescidos, no dia do Espírito Santo
dos Barros, mesmo que não pudesse ir e para manter a tradição, a mãe costumava
mandar-nos a casa dos tios, e nós lá íamos muito contentes. Fazíamos sempre o
mesmo caminho e íamos a casa do tio António e da tia Maria Luísa. Não sei como
a mãe nos deixava ir assim sozinhos, mas a verdade é que íamos, depois dos avisos
para termos muito cuidado ao atravessar a ribeira. Ao fim da tarde
regressávamos sãos e salvos e a tradição continuava, ainda não se havia
perdido.
São boas lembranças que o tempo não deixa esquecer!...
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