DIA DE ANOS
Todos
os dias de anos eram sempre lembrados e festejados, pois a mãe não deixava
passar nenhum em branco.
Num
tempo em que não era hábito receber prendas de aniversário, já nos sentíamos
muito felizes quando pela manhã a mãe anunciava que ia arranjar um galo para o
almoço porque um de nós fazia anos. Quando dava jeito, já na véspera a mãe
fazia uma amassadura de pão, para termos umas rosquilhas de pão fresco nesse
dia; assim já podíamos fazer umas empadas com carne de galinha, o que nos sabia
sempre muito bem. Alguns de nós tínhamos o nosso dia de anos em datas
assinaladas e festejadas: Pedro, no dia de São Pedro, eu, pela Festa do Monte e
Agostinho, no Dia de Reis.
Nestes
dias em que fazíamos anos, a mãe contava-nos sempre as histórias relativas ao
nosso nascimento. Todos nós nascemos na nossa casa e o acontecimento envolvia
toda a gente, desde a avó Serafina que estava sempre presente, até aos vizinhos
que também deitavam a mão, ajudando no que fosse preciso. Então nós lá íamos
ouvindo e sabendo a que horas tínhamos vindo ao mundo, se era dia ou noite,
quem tinha sido a parteira, quem tinha feito as nossas roupinhas e quem tinha
bordado o lençolinho, quando o pai tinha ido falar com o padrinho, em que dia
tinha sido o baptizado e quem nos tinha levado à igreja, como tinha sido a
festa e quem tinha vindo, e tudo o mais que a mãe se ia lembrando. O mais
interessante era quando a mãe contava a história dos nossos nomes, sempre
escolhidos pelo pai, que só lhe contava quando chegava a casa vindo da vila, do
Registo Civil, com a nossa cédula na algibeira do casaco. Todos achávamos muita
graça aos motivos que levaram o pai a escolher os nossos nomes, que a mãe
sempre achou bonitos, excepto quando foi Clara, pois não ficou lá muito
contente.
Estas
e outras histórias ficaram gravadas na minha memória, mas sobretudo na minha alma
e no meu coração. Agora que já não temos o abraço da mãe a dar-nos os parabéns
e a narrar com mestria os factos da nossa vida, havemos de lembrar sempre com
saudade aqueles pequenos momentos feitos de coisas simples mas que foram, sem
dúvida alguma, os melhores que tivemos na vida.