O VÍCIO DOS LIVROS
Desde pequena, mesmo antes de andar na escola primária, sempre
senti uma grande atracção por livros. Lembro-me de virar e revirar vezes sem
conta as folhas dos livros de Pedro, o nosso irmão mais velho, que de vez em
quando me lia algumas das histórias que lá vinham. Olhava aquelas imagens a
preto e branco que ilustravam os textos, as figuras dos heróis, os reis e
rainhas de Portugal com as suas coroas, e tudo isso despertava em mim o grande
desejo de aprender a ler.
Depois que entrei para a primeira classe e aprendi a ler, eu lia
tudo o que surgisse à frente dos meus olhos.
Na escola, para além dos textos que vinham nos meus livros,
lia de fio a pavio a revista ”Fagulha” que a minha professora, a D. Fernandina
Brazão, me emprestava para eu ir lendo quando terminava as tarefas mais rápido
do que as outras alunas, enquanto esperava que também elas terminassem o seu
trabalho.
Quando ia a casa da madrinha também aproveitava para ler;
sentava-me na cadeira de vimes ao pé da janela da cozinha e lia o Diário de Notícias,
a revista Flama e a Crónica Feminina. Às vezes, a madrinha falava-me do Júlio
Dinis que muito admirava e dos seus livros que já tinha lido, principalmente a
Morgadinha dos Canaviais e As Pupilas do Senhor Reitor; também já ouvia o
padrinho falar do Eça de Queirós e do seu livro A Cidade e as Serras, bem como do proibido "O Crime do Padre Amaro".
Entretanto, quando ainda andava na escola primária,
inscrevi-me na Biblioteca Itinerante da Gulbenkian e então pude entrar
verdadeiramente no mundo dos livros. Tornei-me uma assídua frequentadora da Biblioteca
que vinha de duas em duas semanas e parava no largo da Capela Velha, ao pé da igreja, emprestando
livros a quem quisesse ler.
O senhor professor Góis, responsável pela Biblioteca,
aconselhava-nos e indicava-nos quais os livros mais apropriados para a nossa
idade. O máximo de livros que era permitido requisitar eram seis, eu trazia-os
sempre todos e conseguia lê-los naquele intervalo de duas semanas.
Ainda me lembro dos livrinhos do Nody com as suas brincadeiras
e imagens muito vistosas e do livro com ilustrações a preto e branco da
Heidi cujas desventuras me faziam um aperto no coração, mas continuava a ler a
história, sempre à espera do final feliz.
Já um pouco mais crescida, entrei n’As Aventuras dos Cinco,
Os seis primos numa quinta, As meninas exemplares, Os desastres de Sofia e
muitos outros, até que cheguei ao Júlio Dinis, às suas histórias e diferentes personagens
que também me encantavam.
 |
Livraria Cultura, na Avenida Paulista, cidade de São Paulo |
E o gosto pelos livros continuou até hoje. Se há sítios onde
me sinto mesmo bem é numa biblioteca ou livraria. Às vezes digo que numa outra
vida devo ter sido bibliotecária ou algo semelhante, tal é o fascínio que os livros exercem sobre mim. Quando viajo, gosto de
entrar nas livrarias para ver e manusear os livros e sempre encontro algum
livro especial para trazer comigo.
Ler é uma das coisas que me dão mais prazer e não passo sem a
leitura de um bom romance. Gosto de ler no silêncio da noite, absorvendo as
palavras e desenhando imagens no meu pensamento, esquecendo a passagem das
horas, como se o amanhã ainda demore a chegar.
Um livro é sempre um fiel amigo; quem lê um livro nunca se
sente só!...