A CAMINHO DO RIBEIRÃO
A
nossa terra do Ribeirão era a que tínhamos mais longe de casa.
O pai contava que no seu tempo de rapaz, o seu pai - o avô
Manuel António - costumava lá plantar feijão, mas no nosso tempo de pequenos
isso já não acontecia. Como ficava um pouco longe, o pai não plantava lá nada;
apenas tinha pereiros, daqueles de pêros rosados e cheirosos que davam para nós
comermos e também deles se fazia a sidra ou o vinho de pêros, como então se
dizia.
Por altura do Verão, o pai costumava ir uns dias ao Ribeirão,
roçar o mato debaixo dos pereiros para que quando os pêros começassem a crescer
os ratos não os viessem a roer todos. O pai ia logo de manhã e depois nós
também lá íamos levar-lhe o almoço.
Como estas idas ao Ribeirão só aconteciam por esta altura do
ano, revestiam-se quase sempre de um pouco de aventura, com peripécias engraçadas
que de vez em quando saltitam no fio da nossa memória e nos fazem sorrir de
saudade.
Algumas vezes acontecia irmos pelo Lombo do Atalho adentro,
subindo o Lombo Pereira até chegarmos ao nosso destino, mas este era um caminho
mais longo, logo mais demorado e por isso não podíamos perder tempo com
brincadeiras porque o pai já estava à espera do almoço.
Das outras vezes íamos pelas Soqueiras porque demorava menos
tempo. Subíamos pelas Lajas e assim que descíamos o Lombinho da Sequiada parecia-nos
que tínhamos entrado num outro mundo. Dali já não se avistavam as casas do Cabo
da Vargem e do Estreito e não se encontrava vivalma; o silêncio envolvia-nos
como que a convidar-nos a apreciar aqueles campos que já não cheiravam a terra
cultivada porque ninguém os plantava, mas sim às ervas verdes e outras plantas
silvestres que por ali proliferavam.
Então vinham ao nosso pensamento as histórias de bruxas e feiticeiras que o pai nos costumava contar, naquelas noites em que desbulhávamos o feijão ou nas longas noites de Inverno; com algum receio e sempre atentos, olhávamos para um lado e para outro, não fosse aparecer à nossa frente o tal gato misterioso que um dia o pai tinha visto dentro de um palheiro por aqueles lados, um inofensivo gatinho pequeno que foi crescendo, crescendo e se tornou gigante com uns enormes olhos arregalados.
Então vinham ao nosso pensamento as histórias de bruxas e feiticeiras que o pai nos costumava contar, naquelas noites em que desbulhávamos o feijão ou nas longas noites de Inverno; com algum receio e sempre atentos, olhávamos para um lado e para outro, não fosse aparecer à nossa frente o tal gato misterioso que um dia o pai tinha visto dentro de um palheiro por aqueles lados, um inofensivo gatinho pequeno que foi crescendo, crescendo e se tornou gigante com uns enormes olhos arregalados.
À medida que íamos fazendo o caminho das Soqueiras, parávamos
aqui e ali colhendo amoras de silvado e morangos silvestres, daqueles
pequeninos que se escondiam no meio das ervas e que nem sempre eram fáceis de
encontrar. Tínhamos que procurar bastante os pés de morangueiro por dentro das
ervas e quando encontrávamos os morangos vermelhinhos era sempre uma alegria.
Já mais próximo do Ribeirão tínhamos por hábito dar uns
apupos bem fortes que retiniam lá muito à frente, no chão de pinheiros das
Voltas. Era uma sensação mágica ouvir a nossa voz a voltar para nós, como se de
lá longe alguém nos estivesse a responder.
Chegados ao nosso destino almoçávamos à sombra dos pereiros.
Depois, e apesar das tarefas que o pai sempre destinava, ainda havia tempo para
brincadeiras e risotas, ali na beirinha da levada que passava mesmo encostada à
nossa terra.
Pela tarde regressávamos a casa felizes, contentes e bem
descontraídos por estes bons momentos em que nos sentíamos completamente soltos
e livres, enquanto percorríamos o caminho até ao nosso Ribeirão.
Sem comentários:
Enviar um comentário