sábado, 5 de março de 2016

O primeiro de Maio


O 1º DE MAIO E A VISITA DO ESPÍRITO SANTO
Os preparativos começavam uns dias antes com a limpeza da casa. Era preciso lavar as vidraças das janelas, as cortinas, os tapetes, os bordados e os crochets para pôr em cima da mesa. A mãe tirava da mala uns tapetes novos, daqueles às riscas de retalhos, para pôr na sala.

            Na véspera amassávamos o pão e fazíamos os bolos: o bolo preto, ou de família, que a mãe sabia a receita de cor, e o bolo amarelo, o “Bolo de freira”, como então se dizia. Também se fazia as broas de mel e às vezes os biscoitos de manteiga. Entretanto, a mãe já tinha comprado as azeitonas e o queijo, cuja casca cor-de-rosa nos saltava à vista, o que só acontecia em ocasiões assinaladas e neste dia não podiam faltar à mesa.

            No dia da visita tínhamos que nos levantar cedo porque antes de irmos para a missa a casa já devia estar arrumada. Então a mãe abria a mala e tirava a manta mais bonita que o pai tinha trazido do Curaçau, e colocava na sua cama; depois fazia um bonito ramo com as hastes de São José, apanhadas lá mesmo na beira da nossa vinha, e colocava na mesa da sala. A sala já estava pronta para receber o Divino Espírito Santo, era só esperar.

Era sempre uma grande alegria e emoção. O pai esperava no portal para recebê-los e nós esperávamos no terreiro; primeiro entravam as bandeirinhas que nós logo beijávamos, depois vinham as saloias atirando pétalas de flores e cantando acompanhadas pelos tocadores, “Aqui chega uma visita, que já não chegou há tanto, receba com alegria, o Divino Espírito Santo”; no fim, vinham o homem da salva e o Senhor Padre que o pai cumprimentava sempre com muito respeito.

Já dentro de casa o Senhor Padre abençoava todos com a água-benta e havia música e cantigas. Então, quando vinha o Afonso dos Barros a tocar a sua rabeca, havia sempre mais um toque em honra da mãe, que era sua prima. À mãe, brilhavam-lhe os olhos marejados de lágrimas de emoção e saudade dos familiares que já haviam partido ou que se encontravam ausentes.

Antes de saírem, a mãe dava um pequeno envelope com a oferta para o Senhor Padre, outro com a oferta para a salva e outro com um dinheirinho para as saloias. Então elas cantavam “Agradeço a vossa oferta, vossa oferta é um favor, quem vos há-de agradecer, há-de ser Nosso Senhor”.

E lá ia o Espírito Santo para casa dos outros vizinhos. 

 

 

2 comentários:

  1. LINDO!
    A única diferença é que não havia um envelope para a senhor padre; só para a Salva e umas moedas para as saloias. O padre Teixeira já esteve em Gaula.

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  2. Gostei muito!
    A mim também fazia lembrar a cera que se esfregava no soalho no dia antes, tínhamos de esfregar até brilhar... Boa prima!
    Muitas boas recordações !

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