sexta-feira, 4 de março de 2016

Tradição Pascal


DOMINGO DE PÁSCOA

O Domingo de Páscoa era sempre um domingo diferente dos outros. Tinha uma atmosfera especial que até hoje continua impregnada na minha memória e na minha alma.

A lida começava logo de manhã. A mãe levantava-se cedo para ir à missa da manhã e, a não ser que não lhe desse tempo, já deixava o café feito para a matina e destinava o que cada um de nós teria de fazer enquanto estivesse na missa. Quando chegava, nós já havíamos tomado o pequeno-almoço e era hora de nos apastorarmos para irmos à missa do dia.

O primeiro a se arranjar tinha que ser o pai porque demorava mais tempo. Enquanto fazia a barba, a mãe preparava-lhe a roupa e muitas vezes ainda tinha que lhe engomar a camisa branca porque não tinha tido tempo durante a semana. E lá ia o pai todo vaidoso, de camisa branca, fato azul-escuro às riscas muito fininhas, gravata a condizer e chapéu cinzento-escuro. Antes de sair de casa a mãe ainda lhe lembrava que não se esquecesse do dinheiro para pagar a “desobriga”.

Depois também nós nos arranjávamos e íamos para a missa enquanto a mãe ficava em casa a fazer o almoço.

A missa era sempre uma cerimónia bonita. Primeiro saía a procissão em que as pequenas vestidas de branco iam à frente e uma delas levava a cruz. Eu ia sempre na procissão e muito desejava que um dia fosse eu a levar a cruz, mas como era pequena nunca era escolhida e por isso, não cheguei a concretizar esse desejo.

Logo depois das pequenas vinham os irmãos do Santíssimo Sacramento com as suas capas vermelhas, dois deles levando as bandeirinhas do Espírito Santo, por fim o pálio dourado e o senhor padre também paramentado com a capa dourada. Pela ponte adentro, enquanto passava a procissão, o cheiro a musgo e a alecrim misturava-se com o aroma das variadas flores com que as raparigas tinham desenhado o bonito tapete para a passagem do Senhor Ressuscitado.

A procissão entrava na igreja com todo o povo entoando o cântico “Ressuscitou”; lá dentro, o Círio Pascal e todas as luzes acesas faziam brilhar emoções; o cheiro a incenso chegava ao mais recôndito canto da alma.

Depois das cerimónias chegávamos a casa e a mãe já tinha o almoço pronto: um galo guisado com semilhas novas rapadas e aquele arroz branco com uma rachinha de canela, que só a mãe sabia fazer.

O almoço era servido quando estivéssemos todos à mesa e o pai não admitia que algum de nós se atrasasse; era uma regra que tínhamos que cumprir, não só no Domingo de Páscoa, mas também nos outros domingos do ano: a família toda à mesa para almoçar. A mãe primeiro servia a todos começando pelo pai e, como tal, era sempre a última a se sentar.

Depois do almoço vinham as brincadeiras próprias deste tempo da Quaresma. Nós as pequenas jogávamos às cinco pedrinhas e às prendas ou ao jogo do raminho. Os rapazes entretinham-se no jogo do pião.

Assim se passava o Domingo de Páscoa!...
 

                           












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