O LARGO DA
PONTE
Era
no largo da ponte que tudo se passava.
Ali
terminava o caminho da Vargem que começava lá em baixo, ao pé da igreja do
Rosário e havia a ponte, estreita e com varandas de ferro que ligava ao lado do
Estreito. Ali se situava a venda do padrinho, o senhor Faria, e a fonte onde se
ia buscar água, ali se esperava o carteiro e era só até ali que os carros
podiam ir. Nesse tempo os carros eram muito poucos: era um acontecimento quando
chegava um carro à ponte. Os pequenos iam a pé para a escola que ficava perto e
brincavam à vontade no caminho porque não havia qualquer perigo.
Durante
os dias de semana a mãe não nos deixava ir para a ponte a não ser para ir à
venda ou para ir a casa da madrinha. Depois da escola havia sempre em casa
tarefas destinadas a cada um, ou íamos para as Fajãs ou para o Lombo, consoante
o lugar onde o pai estivesse, ajudar no que fosse preciso; portanto não havia
tempo para andar pelo caminho e mesmo não era bonito andar assim desocupado e
sem arreio.
Aos domingos ou nos dias santos à tarde era na
ponte que todos se encontravam. Os homens sentavam-se no muro ao lado da venda
a jogar à milhada e as mulheres juntavam-se em grupo à conversa um pouco mais
abaixo. Os pequenos brincavam à rolha e à matança ou a outros jogos próprios da
época.
No
tempo dos vimes saltávamos ao vime: dois vimes grandes amarrados pelas pontas
faziam a vez de corda; as cordas eram para amarrar os molhos de erva ou de
lenha e não para andar a saltar porque se rebentavam.
Umas
vezes brincávamos ao jogo das prendas (o que se faz ao dono desta prenda que
está para sair?) e ao raminho (aqui trago este raminho muito bem arrematado que
o seu amor manda para ver se é do seu agrado!...); outras vezes aos reis e às
rainhas a quem atribuíamos títulos muito bonitos e pomposos ou muito feios e
horrorosos…Também brincávamos ao galo e às galinhas (falta aqui uma galinha
chamada Teresa, que volta levou?!...), ao jogo da meia-lua e às escondidas.
Na
noite de São João o largo da ponte iluminava-se com a chama das fogueiras que
se faziam; o cheiro a louro e a alecrim espalhava-se por todo o lado; era uma
fogueira grande para os maiores e uma mais pequena para a criançada que não
queria ficar apenas a ver os maiores a saltarem.
Na
altura da Festa eram muitos os dias santos, na primeira e segunda oitava
ninguém trabalhava, por isso muita gente se juntava no largo da ponte e havia
sempre muita animação. Grandes e pequenos jogavam ao jogo do farelo do qual
muitos saíam com as mãos vermelhas e a escaldar, das palmadas que tinham levado
até descobrirem quem lhes estava a aquecer.
Raparigas
e rapazes mais novos faziam as cantigas de roda e aproveitavam para dar uma
piscadela de olhos a quem lhes interessava. Cantava-se a Teresinha de Jesus, a
Borboleta Branca, o Paspalhão, Alargai-vos raparigas que o terreiro não é
estreito, Muito chorei eu no domingo à tarde…
Tudo
isto acontecia no tempo em que ainda não havia televisão em São Vicente. A
partir do momento em que chegou a televisão a maioria das pessoas preferiu
ficar em casa, os momentos de convívio foram-se tornando cada vez mais raros e
hoje só alguns se lembram dos jogos e das cantigas.
O largo da ponte
ainda lá está mas perdeu todo o encanto que sempre teve.
Gostei! Fiquei fã das tuas histórias. Fico à espera de mais. Abraço.
ResponderEliminarAdoro.....Adoro!!!!
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